terça-feira, setembro 17, 2002

Estátuas

Já viu uma estátua? De perto? Já pensou no que passava na cabeça daquele ser humano quando ele fez aquela pose? "Que vou jantar hoje?", "Será que vou vê-la hoje?", "Será que Zeus criou mesmo o mundo?". E o que é uma estátua se não uma foto, um momento da vida de uma pessoa que foi cristalizado em pedra, tal como aqueles pobres indivíduos que foram envoltos nas cinzas do Vesúvio. Existem várias teorias sobre personalidade. Desde as antropométricas, que dizem que conforme as medidas de seu crânio é possível dizer como você é, até as que dizem que está tudo em seus genes (quase igual), passando pelas "é a influência do meio". Há ainda outras que tentam conciliar as duas últimas. Tudo o que levou séculos de estudo de grandes estudiosos.

Mesmo assim, nós, simples mortais, insistimos em classificar cada pessoa que conhecemos a nosso gosto, sem nenhum critério que não o mais subjetivo, sem nenhum objetivo que não nos defender da pessoa e de nós mesmos. Poucos admitem que funcionam assim. Em menor número são os que sabem que todos funcionam assim. Mas mesmo inconscientemente, todos sabem. Sexta a noite, uma das minhas aventuras, o cara que sentou do meu lado no ônibus, chamava-se Roni, e contou-me um pouco de sua vida enquanto enrolava um baseado. Ele gostava de Metal (Black Sabath segundo me lembro), e de baladas com Rock. Mas como eu não gostava de Metal Melódico. Logo que começamos a conversar, eu jamais repararia no que ele estava vestindo, ele apontou para sua camiseta e disse: "Meu, não repara, minha camiseta é da Bad-Boy mas é que na hora não tinha outra, eu odeio essa bosta aqui."

O que me traz a mente uma outra história, essa mais velha. Uma menina com quem conversei em uma balada. Já no final, lá pras três e meia, quatro da manhã, aquela hora em que já não dá pra ficar com ninguém, mas um telefone pode ser interessante. Não me recordo seu nome agora. Bom, eu sempre vou vestido para a noite com uma calça jeans, azul ou preta, uma camiseta lisa, e uma camisa largona jogada por cima. É meu jeito, meio largado mesmo. Enfim, justo nesse dia eu tinha resolvido me vestir como um autêntico boy.

A menina era legal. Era skatista e gostava de Punk Hard Core. Na época eu não conhecia, mas... NOFX é ANIMAL! Pois então, depois de uns 15 minutos de conversa, vi que ela olhava meio torto pro que eu vestia. Defensivamente (como o carinha de sexta) eu disse: "Olha, eu sei que não é o que parece, mas não sou boy, só me vesti assim hoje, não sou eu de verdade." Mas já estava tudo perdido. Conversamos por mais um tempo ainda. Ela me deu o telefone, mas nunca atendeu quando liguei. Desde desse dia procuro não fingir ser o que não sou.

Mas daí, mesmo assim, você descobre que não é visto do jeito como é. E o cara legal que gosta de cinema europeu e livros de suspense é reduzido a um filhinho de papai. E a mão que faz carinho é dita insensível e interesseira. Você é julgado culpado de não ser você mesmo. E julgado seu braço direito recebe aquele numerozinho azul claro, na metade do antebraço: um rótulo. Você pode tentar escondê-lo com uma manga comprida. Mas aquela marca vai aparecer cedo ou tarde. Mas nesse caso, o Holocausto vem depois.

E os braços das estátuas se quebram depois de muitos anos. E as mentes das pessoas se fecham depois de alguns anos. E um coração assustado se petrifica depois de alguns erros. E uma alma se condena depois de alguns segundos de sofrimento. O Fim? Não sei.

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